terça-feira, 31 de março de 2009

Se cortó la coleta

Manchete alarmista do Uol no fim da tarde de uma segunda-feira sórdida em novidades.
García Márquez não voltará a escrever.
Um verdadeiro anúncio fúnebre literário. O amor perde seu maior tradutor. O homem que escreveu sua biografia desde a infância até o dia em que conheceu a mulher de sua vida não irá nos contar o que aconteceu depois. Resta-nos apenas nossa escassa imaginação. O próprio García Márquez, na última aparição pública, disse que escrever dá muito trabalho. Conversa de velho romântico brincalhão. Escrever mesmo, do verbo escrever, assim como ele escrevia, não dá trabalho. É só impossível.

Vento caseiro

Não tenho a menor idéia –e ninguém tem– de onde vem esta expressão que citei algumas notas abaixo, para onde sopra o vento, mas penso que há um erro de preposição. Não é para, mas sim de onde sopra o vento.
Qualquer índio ou pescador ou agricultor ou maluco de pedra sabe que é impossível saber para onde vai o vento, e na verdade nem interessa, de um jeito ou de outro ele vai secar a roupa no varal e enfunar a vela do barco, tanto faz para onde se dirige, qual trigal vai ondular, qual cabeleira vai alvoroçar ou qual saia vai levantar. Ele vai, e isso é o suficiente.
Só se sabe mesmo de onde vem o vento.
Por isso, só por isso, as lavadeiras sabem onde pendurar a roupa, os navegantes sabem a hora de içar o velame e as moças sabem o momento exato de segurar a barra da saia, mas isso só as recatadas, as normais até procuram um jeito de corpo para refrescar o desejo dos passantes.
Sob um calor de 32 graus em dia de chuva no resto do País, eu, que só sei que nada sei, cá estou na varanda a pensar bobagens à espera de pelo menos uma lufada de brisa, como uma biruta de mim mesmo.

Divina demagogia

Os amigos não acreditaram que eu tenha visto Deus. E um mais indiscreto até me perguntou qual os três pedidos que fiz ao todo poderoso criador do céu e da terra. Como tudo isso é mesmo uma grande insanidade espiritual, não tenho pruridos religiosos em revelar o que pedi a Deus na doce e encalorada manhã baiana em que nos deparamos, espero, um com o outro:
- Trabalho, trabalho, trabalho.
E, também espero, que seja estensivo a todos os trabalhadores desse maior país católico do mundo.

Tia Chica e a crise

As ações do Governo Federal para combater a crise econômica mundial que casualmente estourou no nosso quintal são obra da visão macro-sindicalista que se aboletou no poder central. Os metalúrgicos, classe de origem profissional do nosso atual Presidente, são os únicos beneficiados com as supostas medidas de combate ao desemprego que já está grassando por toda área industrial nacional.
O senhor deve estar achando que Lula está protegendo o seu pessoal, o que seria até louvável se não fosse discriminatório, mas não é bem assim. Lula está jogando tudo que tem, ou o que o sistema permite que ele ache que tem, em salva-guardas profissionais porque o desemprego é o item que regula a popularidade do Governo e do presidente.
O espirro escandaloso do PIB, prenúncio de gripe braba, valeu uma queda de 10 pontos percentuais nos índices de aprovação de Lula. Se a situação continuar assim, se o programa de habitação popular não estancar a sangria de vagas com carteira assinada e o povo não tiver mais dinheiro nem crédito para comprar seus ricos carrinhos zero quilômetro, a economia nacional cairá em recessão, e aí, sim senhor, adeus tia Chica.
Ou dona Dilma.

Insegurança pública

As decisões políticas do governo Lula para enfrentar a crise econômica mundial que caiu sobe nossas cabeças não passam de um lencinho para usar como bandana tipo o band leader do Chiclete com Banana. Quase nada significam economicamente, não vão resolver coisa alguma, segundo técnicos especialistas ouvidos pelos três maiores jornais do País, mas estão acendendo vários estopins dentro do próprio governo.
A área mais severamente atingida pelos cortes luláticos é justamente aquela considerada a prioridade número um, a segurança pública. O ministro da Justiça, Tarso Genro, tinha o Pronasci, uma caixinha de band-aids para tapar um ferimento que não cicatriza nunca, a exposição da juventude à criminalidade e ao desemprego, e agora não tem mais. Tarso tinha a reequiparação salarial e a reestruturação material da Polícia Federal, agora não tem mais. Tinha projetos para modernizar e ampliar a rede de serviços penitenciários, mas não tem mais.
Para entender melhor o caso, perguntem ao ministro o que ele acha que vai acontecer com sua candidatura ao Governo do Estado do Rio Grande do Sul. Mas antes, por favor, tirem as crianças da sala.

segunda-feira, 30 de março de 2009

Barba branca

Vinha voando no meu carro, na curva de subida de um viaduto novinho em folha no caminho de casa, quando vi Deus num soslaio entre as nuvens no céu azul. Foi agora de manhã. Verdade. Não acredito Nele e nem sou Ayrton Sena, mas as nuvens desenharam alguma coisa a observar a frenética atividade de gente e de carros no moderno complexo viário do aeroporto, na certa não a mim, sim a todo o povo, mas e se fosse mesmo comigo? Como diria meu pai, vou levar um carão daqueles quando me provarem às portas do paraíso que a maior fantasia da história da humanidade é a mais pura realidade.
Dizem alguns românticos que Deus é Chico Buarque. Acho que não. Parece claro que Deus é Dorival Caymmi. Um artista puro e genial, preguiçoso e bem-humorado, o perfil idealizado de o todo poderoso criador do céu e da terra. Talvez por isso ande flutuando nos céus de Salvador a se mostrar onipresente para alguns desalmados e, quem sabe, a jogar flores imaginárias no colo de muitas desalmadas.
No retão da estrada, todavia, fiz três pedidos. Nunca é demais acreditar em coisas que não existem.

Ok! Batatas fritas...

Impressionante o silêncio da mídia sobre a discussão político-eleitoral nesta luminosa manhã de segunda-feira. Ninguém escreveu coisa nenhuma. Nem parece que há um Ibope recente na praça e acusações pesadas de auto-candidatos. O que está havendo? Acho que é medo. Neguinho ainda não sacou direito para que lado vai o barco, ou para onde sopra o vento, e prefere manter-se calado, pelo menos assim ninguém diz besteira, ou o que é pior, não se compromete política e moralmente.
Repito hoje o que escrevi ontem: a coisa vai pegar fogo. É só questão de tempo. Ninguém consegue enganar todos o tempo todo. Por enquanto, o povo está sorrindo e se divertindo, não há outra coisa a fazer, mas cresce em cada um de nós a vontade de dizer CHEGA.

Ordem no galinheiro

O senhor é jornalista? A senhora também? Então, coloquem a barba e o buço de molho.
Não são? Então não se preocupem, podem vir a ser a partir de hoje, num passe de mágica, ou de profunda irresponsabilidade social do Congresso Nacional. A Lei da Imprensa, um dos legados mais controversos da ditadura militar, deve cair como uma manga podre na votação de hoje no plenário da Câmara Federal, talvez sobre apenas o diploma universitário para provar credenciamento profissional.
A questão é muito delicada, envolve pressupostos e oportunismos, e expõe a fragilidade técnica conceitual de uma profissão vocacional que se transformou em trampolim para outras atividades mais, digamos, comerciais, e está corroendo, enferrujando, apodrecendo os valores éticos e morais do velho e bom e imprescindível Jornalismo.
A Lei de Imprensa nasceu da suposição das autoridades militares de que os jornalistas têm de ser regulados porque não tem idoneidade nem equilíbrio suficiente para informar o grande público. O Estado, nesta ótica transversa, tem que controlar os jornalistas. Mas quem controla o Estado?
Todo mundo sabe que o Estado é incapaz de resolver problemas básicos da sociedade, como segurança, saúde, educação, de onde, portanto, vai tirar habilitação técnica para discutir, por exemplo, liberdade de Imprensa? Da Câmara Federal? Do Senado? Estas duas sagradas instituições nacionais estão mais preparadas para discutir desvios de verbas públicas, crimes de mando, roubo de galinha, bateção de carteira e pequenos arroubos passionais. Mais nada.
Peço, por favor, do alto de exatos 33 anos de profissão, um promontório técnico mais pesado que o ar, que deixem os jornalistas, e principalmente o jornalismo, em paz. Como na economia, e tudo na vida, o mercado se resolve. O Estado não acredita nos jornalistas, e os jornalistas, o senhor e a senhora podem ter certeza, também não acreditam no Estado. E nem por isso estão por aí propondo um código de ética mínima para políticos e governantes.
Cada macaco no seu galho é o o melhor princípio para uma boa convivência.

domingo, 29 de março de 2009

Aniversário de morte

Comentário de uma jornalista especializada em defesa de direitos da infância e juventude.

Meninas sacrificadas

Isabela, Maddie MacCann e Raquel, meninas sacrificadas em templos que a moderna barbárie instalou no centro de grandes cidades. Há cinco meses, dias depois de ganhar um concurso de redação, Raquel é um corpo dentro de uma mala que a polícia ainda não sabe como e porque foi parar ali. Maddie, a inglesinha com cara de anjo desapareceu, desvaneceu-se, virou uma lenda apesar das milhões de libras e milhões de fotos espalhadas por todo o planeta. Há dois anos, um mega mistério. Já a vida e a morte de Isabela Nardoni passou na televisão. Todos vimos Isabela bebê, Isabela na escola e, na cena final, uma boneca no papel de Isabela, pendurada por um dos braços, um segundo antes de cair do sexto andar no vazio escuro da noite paulista.
Se não temos o corpo de Maddie e Raquel é só um corpo, a história de Isabela tem começo, meio e fim, horários cronometrados, cenários, diálogos e vários personagens. Isabela, aos cinco anos, nos conta uma história para adultos, de horror e loucura, que completa hoje um ano.
Os bárbaros do século 21 vestem roupas de grife ou estão nus embaixo de farrapos, comem cheeseburger, vão ao supermercado, falam ao celular, viajam de ônibus, avião e automóveis. As crianças sacrificadas, no entanto, são iguais às de sempre. Sabem usar computador e outras tantas máquinas, falam línguas, opinam, mas são os mesmos sorrisos crédulos, frágeis, a mesma interrogação e o mesmo brilho nos olhos, o brilho da vida.
Como pode alguém violá-las, arrancá-las do berço, surpreendê-las a caminho da escola, negar-lhes o último colo, o último sorvete, calar-lhes o inevitável ultimo grito pela mãe que não vai chegar?
É o que pensamos nós, os não bárbaros, nós, os civilizados, que não sacrificamos meninas, mas estamos na platéia, diante dos altares, no turbilhão do ritual, que já não nos emociona mais.


Eleonora Ramos

A hora do louco

Mal terminei de postar o comentário abaixo, caiu-me à frente dos olhos (oh) algumas frases do deputado federal Ciro Gomes, o Doido. Candidato declarado e obcecado, Ciro é o primeiro a chutar o pau da barraca, mas pelo jeito seu alvo era algo mais abaixo. Acho que pegou em cheio.
Vejam o que o Ciro falou sobre seu grande amigo, o presidente da República, o mesmo que o nomeou ministro.
- Lula é um fanfarrão. Não gosta de trabalhar, engana o povo com facilidade, precisa ser banido da vida política nacional.
- O Brasil precisa de administração profissional e meritocrática. A administração pública brasileira não vai bem. O desempenho do PAC é sinal disso. É muito curioso, se não fosse trágico: hoje tem muito mais dinheiro do que capacidade de fazer. A incompetência de Lula é gritante.
- O Meirelles ajudou o Brasil de forma substantiva no primeira mandato do presidente Lula. Mas o modelo está errado. O BC cometeu um desatino quando a crise já estava instalada e tinha proporções que sabíamos terríveis. Lula não manda em nada.

Fogueira das vaidades

A mídia golpista e reacionária está fazendo um esforço hercúleo para que o distinto público não perceba a realidade política eleitoral nacional.
Dois dias atrás o Ibope divulgou uma pesquisa de intenção de voto para a Presidência da República e não houve a mínima repercussão, como se este fosse assunto proibido. Por que a mídia moitou os números? Porque não interessa ao Governo Federal, o grande mantenedor dos departamentos comerciais das redes de comunicação.
E por que não interessa?
- Porque Serra lidera com muita folga em todos os cenários possíveis.
- Porque Ciro Gomes, surpresa, aparece com índices pra lá de razoáveis.
- Porque Aécio Neves enfeita a rabeira, com perdão da expressão.
- E, principalmente, porque dona Dilma não passa de oito por cento em todos os cenários.
Acertou quem pensou que a coisa vai pegar fogo.
Eu até já estou preparando meu galãozinho de biocombustível não poluente.

Na beira da praia


O ônibus foi parar atolado na areia da praia, sob um céu baiano inocentemente azul. O carro da médica, com ela dentro, ficou destroçado no meio da pista. Fotos Pascoal Gomes.

Acidente ontem à tarde, na praia de Armação. Um ônibus em alta velocidade bateu em meia dúzia de carros, matou uma pessoa, feriu oito e foi parar 100 metros depois, na areia da praia. As pessoas que viram o acidente diseram que o motorista vinha em alta velocidade. A reportagem no jornal A Tarde mal informa as consequências da batida, sem questionar porque o ônibus passou por cima dos carros em um trecho da orla em que não se pode andar a mais de 60 quilômetros por hora. No site do mesmo jornal, um comentário postado na matéria diz que os motoristas de ônibus são obrigados pelas empresas a cumprir uma determinada cota de passageiros por viagem, e que por isso andam disputando corrida nas ruas para não perder o emprego. A pessoa morta no acidente, uma médica de 59 anos, estava sozinha no carro e foi esmagada pelo ônibus sem ter a mínima chance de se defender. Quem é que vai pagar por isso? O motorista? Os donos do ônibus? O Estado?

Zig-zig-zá


Em homenagem dominical aos guerreiros do dia-a-dia pirateamos da Folha outra tira de Laerte.

sábado, 28 de março de 2009

Anúncio desclassificado

Por acaso ou por qualquer outra coisa o senhor conhece algum jovem inteligente, culto, ciente dos direitos e deveres do cidadão, dedicado a melhorar as condições de vida dos mais necessitados, com formação acadêmica (desejada), familiar (obrigatória), e de rua (imprescindível), sem qualquer coloração político-partidária definida, a pardo pode, interessado em substituir veteranos vitaminados e embotocados que representam o povo no Congresso Nacional e que trocam obras públicas de concreto armado por enriquecimento pessoal, ilícito e intransferível?
Acho que não. Esse é um tipo de brasileiro em extinção. Só os filhos de políticos e candidatos a corrupto se interessam hoje por política. Mas se o senhor conhece, por favor, recomende candidatura nas próximas eleições. É barbada. Isso, claro, segundo previsão de analistas, observadores e palpiteiros incorrigíveis como eu.

Dúvida no galinheiro

De Millôr Fernandes, no limite da tangência:

Esse PAC, do Lula, foi realmente um ovo de Colombo.
Mas até hoje dona Dilma não sabe qual.

O que é isso, companheiro?

A militância sindicalista nacional ainda não conseguiu engolir o novo bolo de bobagens capitalistas que o Presidente da República ofereceu ontem aos trabalhadores ameaçados de perder o emprego. “Não é hora de pedir aumento salarial, o trabalhador precisa ajudar a empresa para que essa possa manter os empregos”, disse Lula. Os trabalhadores não estão entendendo nada. E já há gente desconfiando, só desconfiando, que elegeu uma raposa para reformar o galinheiro.

sexta-feira, 27 de março de 2009

Top de cinco segundos

Rendeu nada minha expectativa com a frase racista de Lula e a sentença de quase 100 anos de prisão para uma contraventora milionária. O casal Panos Quentes que edita o Jornal Nacional se encarregou de pulverizar os fatos do dia em uma salada tropical bem ao gosto da classe média, temperada com roubalheiras vulgares e acidentes trágicos banais, pouquíssimo sal, pimenta nem pensar, bom apetite, querido freguês.
Sei apenas, pela web, que os ingleses amanheceram estupefatos e os brasileiros com a cara de bunda de sempre.

Esssssportivas

Meu amigo Bruce Silvestre, publicitário confinado em Brasília, postou duas frases interessantes no msn hoje.
Se não gosta do jeito que dirijo, saia da calçada.
Esportes são a seção de brinquedos da vida.
Não apenas concordo, como fico com inveja, por que não pensei nisso antes?
Estou tentando botar minha cabecinha (?!) na onda do esporte, falar de política e resmungar sobre literatura são coisas tão difíceis quanto inúteis.
Neste fim-de-semana, na base do cheire Ronaldo e fume Barrichelo, vou de futebol e fórmula 1. Sou Grêmio onde o Grêmio estiver e BrawnGP desde pequeninho.
Eu mesmo, glorioso meia-armador, estou fora do clássico de sábado entre Veteranos e Ex-Jovens, no estádio Monumental da Colina (25 x 15 m), por causa de uma pequena lesão na virilha, mas estarei no banco de reservas dando palpite na arbitragem.
A vida não é feita só de ignorâncias e enigmas. E as bobagens são a parte mais divertida.

quinta-feira, 26 de março de 2009

Em cima da hora

Duas manchetes online desde às quatro da tarde.
Lula diz que crise foi causada por comportamentos irracionais de gente branca de olhos azuis.
Dona da Daslu condenada a 94 anos de prisão.
A frase de Lula foi pronunciada em uma amistosa cerimônia diplomática, no Palácio do Planalto, em recepção ao primeiro-ministro britânico, Gordon Brown.
A dona da Daslu foi presa ontem e sentenciada hoje. O atestado médico para tratamento quimioterápico de um câncer não serviu como habeas-corpus.
Não sei bem o que as duas notícias têm uma com a outra, mas suspeito que a resposta para este enigma vespertino passa pela palavra irracionalidade.
O Jornal Nacional vai ser interessante.

Conversa fiada

Algumas figuras públicas com ambições políticas mas desvinculadas de qualquer compromisso ideológico ou partidário, a não ser, claro, interesses pecuniários pontuais, se encarregam em manter o mais baixo possível o nível do debate político nacional.
Ontem, zapeando canais no horário dos telejornais locais, fui surpreendido pelo radialista Raimundo Varela, figura popular que se acredita uma espécie de filósofo contemporâneo seduzido pela mosca azul. A pretexto de defender um novo sistema de escuta telefônica implantada pelo governo na Bahia, Varela atacou furiosamente o deputado ACM Neto, a quem apoiou na eleição para prefeito de Salvador, cinco meses atrás. O que houve? Por que o radialista mudou do vinho pra cachaça, do azul pro vermelho, de lá pra cá, do isso pro aquilo? Tenho um palpite.
A historinha a seguir talvez ajude a encontrar a resposta para o troca-troca de opinião tão normal entre os políticos profissionais, e alguns tolos que tentam se equilibrar no cabo de aço enlameado que liga a classe política à comunicação.
Pelotas, eleição municipal, 2008. De repente, no meio do horário eleitoral, o Partido Verde, de suposta coloração esquerdista, dispara uma bomba atômica de pura baixaria contra o candidato do Partido dos Trabalhadores. Surpresa geral. Por que? Porque o bravo PV havia alugado seu espaço no horário eleitoral para o candidato adversário, de tendência malufista, inimigo natural do PT. Dois dias depois, nova surpresa. O PV ataca o candidato malufista. O partido ecológico enlouquecera? Não. Soube-se que o caso era só negócio, nada pessoal, ou seja, o cheque tinha sido devolvido. Mais dois dias e olha lá o PV atirando de novo, no mais baixo nível possível, no candidato do PT. O cheque, desta vez, na reapresentação, afinal, tinha compensado. A história arranjou um lugarzinho nos anais da trágica trajetória eleitoral pelotense –e ficou por isso mesmo.
Mudança de opinião entre políticos, não tenha dúvida, é apenas formalidade comercial. As alegorias folclóricas, ou mesmo ideológicas, são apenas alegorias. Já estão embutidas no preço.

quarta-feira, 25 de março de 2009

Minudências

O líder direitista francês Jean Marie Le Pen reafirmou hoje no Parlamento europeu que o uso das câmaras de gás na Segunda Guerra mundial foi apenas um detalhe. O técnico de futebol Carlos Alberto Parreira também disse certa vez que o gol era apenas um detalhe. O compositor Roberto Carlos cantou e ainda canta que coisas pequenas são apenas detalhes.
Estou tentando acreditar que o “saldo insuficiente” com que a máquina do banco respondeu horas atrás a uma tímida tentativa de saque também seja apenas um detalhe na grande conspiração internacional para acabar com a minha paciência.

Nas asas da imaginação

Pouco tempo atrás Brasil e a Itália estiveram envolvidos em uma discussão político-filosófica sobre soberania e seriedade. Hoje há um exemplo claro na mídia (Estadão e La Repubblica) sobre quem é sério e soberano de verdade.
O piloto, o co-piloto e o presidente de uma companhia aérea tunisiana foram condenados a penas de oito a dez anos de prisão por um acidente no mar da Sicília três anos atrás. Eles foram considerados culpados pela queda do aparelho porque o piloto começou a rezar quando faltou combustível. Enquanto o débil mental rezava, o aparelho caiu e 23 pessoas morreram.
Aqui no Brasil ninguém foi punido ou sequer molestado judicialmente pelo assassinato de 199 pessoas na queda e explosão de um Airbus no aeroporto de Congonhas. E a empresa ainda nem pagou as indenizações.
Lembro apenas que ninguém é obrigado a voar por determinada companhia. E nem a votar em certos candidatos revolucionários.

Sonhando com o inimigo

Eleição/2010. Não sei se os senhores perceberam, mas nunca neste País uma corrida eleitoral começou tão cedo e com tantas discrepâncias. Além de colocar dona Dilma Roussef em todos os telejornais e anunciar bondades ansiadas pelo baixo eleitorado nacional todo santo dia, como carro novo e casa própria, sem um mínimo programa de saúde pública ou de educação ou de segurança, o Governo Federal está empenhado em indicar o candidato adversário.
Qualquer idiota sabe que José Serra é fortíssimo candidato à Presidência da República, com confortáveis 40 por cento da preferência do eleitorado, mas todos os homens públicos do país, ou pelo menos todos aqueles comprometidos com o projeto político do presidente Lula, estão enchendo a bola do governador de Minas, Aécio Neves, como o melhor nome para a oposição, na clara intenção de influenciar a decisão do PSDB. Um absurdo improvável que só serve para dar nome aos bois.
Ouvir José Dirceu afirmando que Aécio é o nome mais capacitado para enfrentar Dilma dá vontade de rir. Quem o Governo pensa que engana? Acertou quem respondeu o eleitorado nacional.

Sexo seguro

CQC. Não sei se os senhores assistem, eu assisto e gosto muito. Há muito tempo que a televisão brasileira não faz ninguém rir com um mínimo de inteligência, acho que desde o eclipse imposto pela Globo a Chico Anisyo e o desaparecimento de Tom Cavalcante atrás da cortina fundamentalista da Record. Apesar da intensa repercussão na mídia, o programa não consegue ultrapassar os sete pontos no índice do Ibope e parece já ter batido no teto. Segunda-feira, em uma edição absolutamente truncada, foi apresentado o quadro Palavras Cruzadas, com um padre e uma atriz pornô, mal deu para entender uma frase ou outra. O apresentador, jornalista Marcelo Tas, chamou a moça de prostituta, mas em seguida se redimiu, pediu desculpas e tocou o barco adiante. Pois a moça vai processar o programa. E a mídia começa hoje uma hilariante discussão sobre o que é uma prostituta e o que é uma atriz pornô, ou seja, qual a diferença real entre estas duas pessoas.
Do alto de minha escassa experiência com esse tipo de gente, acredito que atriz pornô seja uma espécie de camisinha ortográfica que se usa quando se vai falar ou escrever sobre prostituta. Ou ao contrário.

terça-feira, 24 de março de 2009

Oi, tava penerando...

O inferno político astral do Ministro da Integração Nacional está só começando. As deslavadas pretensões eleitorais de Geddel Vieira Lima, baseadas única e exclusivamente na quantidade de tinta de sua caneta ministerial, estão se dissipando como a neblina que costuma chatear os motoristas na estrada para Feira de Santana. Não demora, o sol vai brilhar. E na claridade do astro rei será possível entender, por exemplo, como e porque o ministro registrou em seu nome, no mesmo dia e no mesmo cartório, 10 fazendas na zona cacaueira. Dez fazendas. No mesmo dia. Não tem peneira que resolva.

Incompetência

Escrevi numa nota ontem, ou melhor, perguntei por que o instituto DataFolha não incluiu o prefeito de Salvador nas pesquisas eleitorais para o Governo da Bahia. Parece que o motivo é simples, e de caráter essencialmente jornalístico. A Folha substituiu o jornalista Luis Francisco, responsável pelo escritório de Salvador há quase 20 anos. O novo repórter, recém chegado da paulicéia, parece que trouxe na bagagem o adjetivo desvairada, aquele que qualifica tão graciosamente a capital paulista, e não soube decifrar o quadro sucessório baiano para os técnicos do DataFolha. O instituto apresentou quatro simulações para os pesquisados e esqueceu do nome que muito provavelmente deve estar bem colocado na preferência dos eleitores, pois acaba de detonar o PT e o DEM em confronto direto pela prefeitura de Salvador.
Há outras versões circulando na praça, mas prefiro não me aventurar neste túnel escuro da política baiana.
Espero apenas que a Folha corrija a injustiça e reconduza Luis Francisco ao cargo. Em nome da ética, por exemplo.

Delúbio, a volta

A mídia golpista e reacionária está tratando o caso com luvas cirúrgicas. Parece à espera de uma posição mais clara, mais definida, mais lógica do cirurgião-geral, chefe do Departamento de Operações Políticas, e casualmente Presidente da República. Até agora não se sabe o que Lula pensa a respeito do reingresso do tesoureiro do mensalão no Partido dos Trabalhadores. Deve ser a favor, sem dúvida. Assim como toda a cúpula do partido. Há um ranço nas correntes, digamos, mais acadêmicas, mas a base petista sabe muito bem dos serviços prestados por Delúbio e de sua fidelidade ao partido e ao capo de tutti capi.
O interessante, no noticiário de hoje, entretanto, é a posição de João Felício, da ala Construindo um Novo Brasil, a ala de Delúbio. O senhor João acredita que “há perseguição tucana contra Delúbio. É uma pessoa honestíssima, conheço desde os anos 70". Reduzir a questão à perseguição política é ingenuidade ou ignorância. O melhor dos petistas, sinceramente, é quando estão calados –e com as mãos nos próprios bolsos.

segunda-feira, 23 de março de 2009

Simulação equivocada

Estranho. O DataFolha divulgou hoje a parte baiana de sua pesquisa nacional para os governos de Estado, ano que vem. Em todos os quatro cenários propostos, o governador Jacques Wagner lidera com folga. O Ministro da Integração Nacional, Geddel Vieira Lima divide o fim da fila com o radialista Raimundo Varela. Os candidatos do DEM, o partido dono da Bahia quando se chamava PFL, disputam entre si o segundo lugar. Tudo bem, não há surpresa nos resultados, talvez apenas a má performance de Geddel.
O que qualquer pessoa razoavelmente informada na Bahia estranha na consulta do mais conceituado instituto de pesquisas do País é a falta do nome do prefeito de Salvador, João Henrique, que acaba de vencer a esquerda e a direita de uma só vez. Pelo menos a matéria publicada na Folha não cita o prefeito reeleito como candidato em nenhum dos cenários.
Fala-se abertamente pelos bastidores políticos e pelos botecos da periferia de Salvador que João Henrique é candidato natural ao Governo do Estado, com apoio de Geddel ou de ACM Neto ou de Jacques Wagner, tanto faz. O povo baiano cai de saber que João Henrique é o cara, o homem a ser batido.
A pergunta que não quer calar, claro, é por que o DataFolha não considerou o prefeito de Salvador entre as alternativas para o Governo do Estado?

Carecas cabeludos

Na onda das coisas que que nunca existiram, que jamais irão nos atingir, em que a nação é maior que isso e que nunca antes nesse País estivemos tão preparados para as adversidades, como a marolinha, por exemplo, vem aí de volta o mensalão. Marcos Valério é o único preso. E acaba de levar uma coça violenta dentro do presídio. Parece que o careca mais descarado do país resolveu dar com a língua nos dentes. O advogado do publicitário corruptor de maiores de idade está pedindo para que seu cliente se beneficie dos direitos da delação premiada.
Agora finalmente vai começar a crescer cabelo na cabeça de José Dirceu.
E a cair a máscara de vários mocinhos desta comédia de terror.

O bando de loucos


A festejada torcida do Corínthians, cortejada como virgem santa pelas emissoras de televisão,
faz o que melhor sabe fazer nas arquibancadas de estádios de futebol: sair na porrada com a Policia. Foto de Zanone Fraissat, capa da Folha de hoje.

domingo, 22 de março de 2009

O samba do sabiá doido

Além do magnífico Tarzan, o rei da selva, e da não menos magnífica grafia da elocução dos macacos, sir Edgar Rice Burroughs também legou à humanidade a tradução básica da linguagem dos cachorros. Pouca gente sabe o que dizem os cachorros a latir no portão da casa onde moram. Pois sir Edgar sabia. E contou. Os cães simplesmente ladram para avisar aos outros cães das cercanias que quem manda ali é ele. Por exemplo, o cachorro aqui de casa vai todos os dias ao cair da tarde para o portão e late ao léu por um bom tempo. Segundo sir Edgar, o espertinho está dizendo “eu sou Gabeira, um cão boxer muito brabo, meu dono é o seu Antonio, também muito brabo, e aqui não tem pra ninguém”. Mais ou menos isso.
Mas estou escrevendo esta aparente bobagem dominical para dizer que gostaria que sir Edgar tivesse decifrado e nos contado também o que dizem os pássaros. Nem vou envolver os gatos nisso, esses todo mundo sabe que são uns falastrões. Há alguns que palestram, cantam, declamam à lua, são os domesticados talvez mais adaptados a nós e nós a eles. Então, reclamo a sir Edgar apenas a língua dos pássaros.
Observo a passarada todos os dias da varanda de casa. Conheço muito deles, suas manhas, rotinas, esquisitices, manias. O sabiá, por exemplo, é o mais legítimo dos cantores. Canta para chamar, para avisar do perigo, e também canta só por cantar. Sem mais nem menos, olha lá um laranjeira gordo à sombra da goiabeira cantando guarânias, boleros, sambas. Já o bem-te-vi não canta. O bem-te-vi fala. E é isso que me intriga. O que diz o bem-te-vi? Tento traduzir.
Agora mesmo vi três deles contra-atacando um gavião que ousou invadir o alto de um pinheiro que na certa abriga um ninho recheado de ovos. O gavião, depois de breve e acirrada discussão, na sua lerdeza de príncipe inatingível, abdicou do ataque e foi embora numa trajetória parabólica longa e larga. Dois dos bem-te-vis desistiram da curva nas alturas e voltaram ao ninho, mas um terceiro continuou gritando atrás do gavião. O que ele dizia? Acho que era “sai, sai, safado, vai roubar os ovos da tua mãe, volta aqui miserável, tu é grande mas não é dois”. Essas coisas.
Afinal, que falta nos faz uma inteligência realmente útil, capaz de entender os animais, esses colegas de planeta tão misteriosos e incompreendidos. E o pior para minha tola expectativa de um dia ver decifrada a linguagem dos vizinhos ditos irracionais é saber que os acadêmicos estão preocupados em unificar a língua portuguesa botando um hífem aqui, tirando outro dali, e olha que hífem pra gente como eu, sinceridade, sempre foi conhecido como tracinho.
Sou obrigado a continuar lendo Saramago escrever econômico com acento agudo e a esperar que alguém encontre escritos inéditos do pai do Tarzan, o pai verdadeiro, não o biológico, sobre a eloqüência estridente dos passarinhos. Krik ak bandolo.

Lula lá

Hoje tem festa na Bahia. Primeiro, porque tem sempre. Segundo, porque hoje é dia de Bavi. E terceiro, porque meu amigo Lula Martins, super-herói underground, lança livro em que mistura ficção e fatos reais, igualzinho a vida faz com a gente todos os dias. O título é Mágicas Mentiras. Gosto muito de Lula, mas não é grande vantagem, toda Bahia gosta.
Nos anos 60, por exemplo, só por exemplo, Lula participou da Bienal de São Paulo com uma instalação muito interessante, um avião feito de caixões de defunto. Pouco tempo depois, fotografou e fez a capa de alguns discos antológicos na então revolucionária música popular brasileira, como o cultuadíssimo Acabou Chorare, dos Novos Baianos. E co-dirigiu e atuou como protagonista no famoso Meteorango Kid, o primeiro grande filme experimental do cinema brasileiro pós Glauber Rocha. É, como se diz, uma figuraça.
Uma pena que tenha inventado de lançar o livro às cinco horas da tarde, num domingo, na Praça Castro Alves. E em dia de Bavi e com o Ronaldo dando show na televisão, com direito a coadjuvante da vez. Lula que me perdoe, mas acho que vou chegar atrasado.

Erro tático

O Rio Grande do Sul é o único Estado, pelo menos até agora, onde o governador, no caso a governadora, não lidera as pesquisas e, pior, só aparece em terceiro lugar, com menos de 10 pontos percentuais. Yeda Crusius, como se sabe, enfrentou, e ainda enfrenta, pesadas denúncias sistemáticas de má administração e até corrupção no serviço público.
O presidente Lula, que não tem nada com isso, claro, se comentasse a desconfortável posição do PSDB no sul do País talvez fizesse uma de suas metáforas futebolísticas para curtir com a cara de embasbacado de Fernando Henrique: “os tucanos ainda não aprenderam que a defesa não pode marcar em linha, eles levam bola nas costas o jogo inteiro”.

Mar à vista!

Estamos a 19 meses das próximas eleições e já há resultados de pesquisas incomodando partidos, institutos, candidatos, jornalistas, cientistas políticos, marqueteiros e palpiteiros em geral. A Folha de hoje se dedica a assombrar os leitores com, digamos assim, esta prévia das prévias da grande prévia final. A Folha pesquisou São Paulo, Minas e Rio Grande do Sul. Em Sampa, Alckmin lidera folgado, não há inimigo à vista, apenas a sombra de Marta Suplicy, Palloci é apenas uma miragem. Em Minas, uai, Hélio Costa é a surpresa governista seguido, vejam só o que é a vida, por Patrus Ananias, com 30 pontos de vantagem. Nos pampas, Tarso Genro lidera em todos os cenários com José Fogaça fungando no cangote, dois pontinhos atrás. Ainda falta mais de ano e meio para o pleito, mas acho que estes números não mudarão muito, não. É claro que quem viver verá, isso, lógico, se por acaso não estiver com os olhos embotados de ilusões e lágrimas.

sábado, 21 de março de 2009

Voando com o inimigo


Um quetzal em pleno vôo. Para ouví-lo, site da Universidade São Carlos, San José, Costa Rica.


Os Almas-de-Gato voltaram. Silenciosos, discretos, exuberantes. Acho que são o elo de evolução entre o pássaro, o gato e deus. E são pássaros tristes, acredite. Nenhum pássaro, por supuesto, tem qualquer motivo para ser triste, mas vá lá entender esses desconfortos da alma. Tente perguntar a um uirapuru porque ele canta como se estivesse sendo estraçalhado. Ou a um quetzal porque ele emite o som do sangue, o gemido dos feridos de morte. A tristeza do alma-de-gato, entretanto, me alegra. Eles se enfurnam nos ninhos nos pinheiros, vez em quando cruzam garrras uns com os outros, tem lá, sim senhor, seus momentos de alegria, eu, sim, sou muito mais triste do que eles.

De bem com a vida

Sábado. Nubla, não nubla, de vez em quando um chuvisco colombiano. Jornais? Melhor nem lê-los. Chamadinhas na capa online da Folha de hoje: lançamentos e exposições celebram o Pequeno Príncipe no Brasil, novo exame ajuda a saber se dor no peito é cardíaca.
É. O senhor não leu nada errado. É o Pequeno Príncipe mesmo, aquele conto de fadas adocicado de Saint-Exupéry. E o rapaz redator ainda não entendeu (deve ter menos de 30 anos de idade) que toda dor no peito é do coração. Até as facadas traiçoeiras. Ainda bem que hoje é dia de futebol aqui em casa. Pelo menos posso aparafusar mais um zagueiro no campinho. O senhor? Bem, o senhor devia estar lendo Flaubert, Márquez, Llosa, Saramago... Ou revendo aqueles antigos planos de expodir o Palácio do Governo.

sexta-feira, 20 de março de 2009

O que quer essa língua


Saiu, afinal, o novo Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, editado pela Academia Brasileira de Letras. Segundo pôde-se ver nos telejornais do dia, são mais de 800 páginas, 345 mil palavras, R$ 120 reais o exemplar, e pelo menos um erro crasso. A palavra reescrever está grafada com hífem. Até ontem à noite, pelo menos, este hífenzinho traquino ainda não havia se intrometido nesta palavrinha tão, tão... tão emblemática.

E toca o sino

Últimos fatos pendurados no varal do quintal nacional. Fatos fátuos que não valem uma nota isolada, apenas fazem cócegas na cabeça, e botam os antigos revolucionários que esqueceram seus ideais em alguma praia distante, em algum promontório desta terra desolada, a pensar no dia de amanhã.
Ei-los.
- O senador Tião Viana ameaça explodir uma bomba no senado Federal e o Senado Federal ameaça explodir uma bomba no bolso do casaco Armani do senador.
- O senador José Sarney é responsável pela nomeação de cerca de 130 dos 180 cargos de diretores do Senado Federal. Ele nomeou e agora está indignado com o número de cargos –acho que o Múmia queria, isto sim, nomear TODOS.
- O senador Sérgio Guerra está propondo aumentar o tempo dos grandes partidos na tevê e diminuir o dos pequenos. Eu, da minha sólida ignorância democrática, apóio a idéia com entusiasmo. Tirar Globo, Bandeirantes, Record e SBT do ar, nem que seja por 10 minutinhos, é uma grande vitória popular. Nem que seja para ouvir o êêê Emael, o democrata-cristão...
- Tanto bate até que fura. A marolinha está desbastando o montículo de popularidade positiva do presidente Lula. Barragens no Planalo deviam ser obra prioritária do PAC.
- O governador José Serra continua sentado em confortáveis 40 por cento de preferência do eleitorado para a sucessão presidencial. Mas a mídia golpista e reacionária está se encarregando de minar a popularidade do tucano com matérias “investigativas” nas áreas de Segurança, Educação e Saúde. Pobre Serra. Deve chegar ao fim do ano em frangalhos, se chegar.
- Dizem que o balão da Dilma está pesado. A realidade das pesquisas não bate com as mais contidas previsões políticas eleitorais, como de Fernando Henrique, por exemplo. Não vejo assim. O balão está subindo. Isso é o que importa. E há tempo suficiente para chegar ao topo. Ou mais.
- O senador Fernando Collor não se aventurou a surfar a repentina e surpreendente marolinha de popularidade que uns míseros segundos de visibilidade levantaram sobre a Comissão de Infra-estrutura do Senado. Como se sabe, em caso de cobra criada, é justamente no silêncio que mora o perigo.
- O delegado Protógenes... Bem, o delegado Protógnes merece uma crônica. Ou um romance.

quinta-feira, 19 de março de 2009

Vade retro



Como diz o Gilberto Gil, momento histórico. Estas duas fotos invadiram a Internet hoje de manhã. Dois dos grandes monstros da história da humanidade, Charles Manson e Josef Fritzl. Atrás desses olhares psicóticos, a mesma ideologia transversa expressa na testa de Manson e na origem de Fritzl. A história se retorce na realidade do mundo de hoje tentando botar a cabeça de fora. A prisão perpétua não devia dar chance à posteridade. A pena de morte, nestes casos, seria em defesa da humanidade.

Graça de elefante

Nem sempre o que se fala se escreve. E nem sempre entendem o que se escreve. E às vezes se escreve o que nem tinha sido pensado antes. Quer dizer, é difícil controlar as palavras que se pronuncia ou se escreve. Ou melhor, é difícil se fazer entender quando as palavras se arvoram a palavrear sozinhas através de nossa boca ou de nossos dedos.
Isso para mim, lógico. Para José Saramago, por exemplo, não é bem assim. Ou é, mas a diferença entre nós é que ele sabe disso, eu não, eu aprendi com ele.
E faço o favor de repassar a vocês (os oito do blog!) a frase que abotoa um paragrafozinho na Viagem do Elefante, um simples digressão que deve ter feito todos aspirantes a escritor cair na gargalhada. Ei-la.

Reconheça-se, já agora, que um certo tom irônico e displicente introduzido nestas páginas de cada vez que da Áustria e seus naturais tivemos que falar, não só foi agressivo, como claramente injusto. Não que fosse essa a intenção nossa, mas, já sabemos que, nestas coisas da escrita, não é raro que uma palavra puxe por outra só pelo bem que soam juntas, assim muitas vezes sacrificando o respeito à leviandade, a ética à estética, se cabem num discurso como esse tão solenes conceitos, e ainda por cima sem proveito para ninguém. Por essas e por outras é que, quase sem darmos por isso, vamos arranjando tantos inimigos na vida.

Ao Bailarino

A cada dia que passa pioram as chances do Brasil sobreviver à marolinha na mesma exata proporção inversa em que cresce o otimismo das hostes governamentais.
Esse “hostes governamentais” é apenas um eufemismo para o fanatismo ideológico religioso que move a militância voluntária do lulismo, ou só uma piadinha política para enfeitar esta notinha quase caseira.
Um amigo meu, destes de muitos anos e de absoluta lealdade recíproca, destes que passaram a acreditar na palavra oficial do Governo, mandou-me um e-mail ontem à noite, logo após o habitual show de otimismo governista do Jornal Nacional, com os números da recuperação da economia. Fui dormir triste por entender que um velho companheiro de trincheira não consegue se desvencilhar de um “velo de alquitrán em la mirada”.
Abri o site da Folha agora de manhã e lá está a versão correta para a dança dos números do oficialismo. Foram criadas nove mil vagas formais e cortadas outras 56 mil no mesmo período, ou seja, este é o pior resultado da economia nacional desde 1999.
Esta é a realidade. E ela não é feita apenas de interesses políticos eleitorais, também entram na receita do bolo alguns litros de suor e uma boa pitada de lágrimas.

quarta-feira, 18 de março de 2009

Castelo de sonhos

Parece cuidadosamente encoberto por panos quentes –ou lençóis de seda– o trágico e hilariante caso do deputado do castelo. No primeiro instante após a denúncia, levantaram-se vozes moralistas de todos os quadrantes da Pátria amada. Hoje, os políticos ainda disfarçam alguma indignação. Amanhã, com certeza, vão esquecer. Talvez o caso volte aos jornais quando começar o processo pelo tombamento de tamanho patrimônio histórico da ética e moral da política nacional.

Museu nacional

O senador José Sarney disse que não sabe porque, de repente, começaram a tirar os esqueletos do armário. Creio que o senador Tião Viana podia explicar, com todo respeito, claro, ao ex-presidente da República que este é o momento mais adequado já que o Senado está sendo presidido por uma múmia.

Em nome da lei

O Senado Federal é a casa do povo. Isso é o que a gente pensa. O Senado Federal é a casa dos senadores. Isso é o que os senadores pensam.
Alguns fatos que vieram à luz nos jornais de hoje podem ajudar o senhor a saber, afinal, de quem é a Casa, a Santa Casa que cuida dos interesses maiores da Nação –os menores já estão todos resolvidos, com contra-cheque robusto e outras vantagens funcionais.
Vejamos apenas dois dos últimos casos denunciados à Imprensa por alguma alma desagregadora:
- o senador Tião Viana deu telefone celular do Senado para a filha que foi passear no México.
- o senador José Sarney trouxe familiares do Maranhão com passagens pagas pelo Senado e hospedou o pessoal na residência oficial do Senado.
Esses dois piedosos sacerdotes do povo disputaram a presidência do Senado e um ganhou do outro na base do conchavo, da deslealdade e da sacanagem pura e simples. Afinal, vitória, nessas circunstâncias, pouca importa. O corporativismo decide as questões pessoais, e o dinheiro resolve as divisões ideológicas.
O que nós temos a ver com isso? Quase nada. A gente só paga a conta.

360 graus

O senador José Sarney deve anunciar daqui a pouco uma reforma administrativa no Senado Federal. A imoralidade chegou, como dizem os próprios políticos, às raias do absurdo. O senhor sabe quantos funcionários tem o senado para atender 81 senadores? Seis mil e quinhentos. Isso mesmo, 6.500. Só em cargos de diretor são 136. Esta mega estrutura serve, na verdade verdadeira, como escada para políticos como o ex-presidente Fernando Collor, por exemplo. E o próprio Sarney, responsável pela maioria das nomeações desses diretores de altos salários. Altos salários deles, claro.

segunda-feira, 16 de março de 2009

O tema da vez


Versão do cartunista Caco Galhardo para ilustrar a teoria da evolução, hoje, na Folha.
Discordo do gambá. Esta aí o arcebispo de Olinda e Recife para provar que antes de sermos macaco éramos ratão do banhado.

Para onde vamos

Estou muito contrariado com a Ciência, ou melhor, decepcionado, quase frustrado. Não, frustração é como ingratidão, e isso não, isso não. Estou insatisfeito, pronto, vá lá que seja. Um dos antropólogos mais notáveis entre todos os seguidores de Charles Darwin anunciou, talvez com um sorrisinho nos lábios, que a evolução acabou. Isso mesmo. Acabou. E ainda disse mais, nunca foi possível comprovar se a evolução foi de fato para melhor, pode muito bem ter sido ao contrário, embora esta parte seja muito difícil de entender, as circunstâncias das mutações genéticas são imperscrutáveis. Segundo o cientista, o máximo que pode acontecer à humanidade é homens e mulheres ficarem um pouco menos inteligentes. Nada de alta capacidade de raciocínio nem superpoderes. Nossos tataranetos não serão mais capazes do que nós. Ninguém jamais terá os dentes restaurados como os tubarões nem voará nas alturas como os urubus. Podemos apenas mirrar e emburrar.
Que coisa mais sem graça a evolução. Acho que vou virar criacionista, pelo menos meu bom ou mau comportamento na terra do Senhor decidirá se vou me refestelar nos encantos do céu ao queimar no fogo eterno do inferno.

Gaveta virtual

Outro trecho de conto perdido na tal pastinha no Meus Documentos. É um parágrafo digressivo de uma história linear sobre pai e filho. Imagino que isto seja literatura. Saibam.

O senhor
Ramiro Pancho Ortives viveu a maior parte de sua vida com uma chave de fenda nas mãos, cansado da lida diária de uma oficina de carros velhos, de uma mulher chata que só sabia fazer sopinhas de verduras e nada entendia de assados, a comida que move o mundo, e de dois filhos como a maioria dos filhos de gente igual ele, e jamais imaginou que pudesse morrer tão cedo, com uma bala cravada no meio da barriga, como um segundo umbigo sangrento, os olhos esbugalhados para o fim de uma vida que foi pouco mais que uma pasmaceira de coisa nenhuma. Todo santo dia esperou que deus ou qualquer outra coisa acendesse uma luz nas trevas inexpugnáveis de sua cabeça, mas o máximo que conseguiu ver foi uma luzinha trêmula de vela de aniversário a iluminar de lampejos amarelos de alguns instantes que ele pensava terem sido da mais plena felicidade. O pior é ver o assassino escapar na maior tranqüilidade. Ninguém por perto. O barulho da chuva deve ter confundido o som do estampido do revólver. O homem que o matara por nada iria escapar, já tinha escapado. Quase não sentia dor, o problema maior é que não podia se mexer. A paralisia fatal que acomete todos os feridos de morte havia ocupado cada centímetro de seu corpo. Mas ainda podia ver e escutar e pensar. Uma mulher cantava uma música bonita e incompreensível no rádio. Round Midnigth. Ele não sabia uma palavra em inglês. Quer dizer, talvez uma dúzia e meia, mas não conseguia entender o que aquela voz, a voz de uma mulher negra, com certeza, dizia tão docemente, tão tragicamente verdadeiro. A melodia corria pelo teto varado de luz, a negra soltava as palavras como pássaros venenosos e ele não entendia nada, estava morrendo e não entendia nada. Morto por nada, por uma merda de pneu velho, morto por achar que tem coisa certa na vida e coisa errada, por achar que dois e dois são quatro, devem sempre ser quatro, apesar de um revólver apontado para sua barriga. Precisava ficar calmo, esperar pelo socorro, mas sabia que o pior estava por vir, era sempre assim, o pior chegava logo em seguida a alguma coisa muito ruim. É sempre assim na vida de gente como ele. Então sentiu uma dor no peito, o lado esquerdo inchando de dentro pra fora. Uma dor muito forte, grossa, constante. O pior chegava. Não bastava levar um tiro na barriga e ficar imobilizado no chão engraxado de uma oficina, não, não bastava, agora viria o ataque cardíaco. Puta que pariu. Um tiro na barriga e um ataque cardíaco. Puta que pariu. Tateou à procura da chave de fenda. Achou e empunhou como uma faca. Pensava em golpear o peito. Um haraquiri de chave de fenda. A dor tomava conta de tudo. Não podia mais pensar. Não conseguiria nem o haraquiri. Ainda bem que a mulher parou de cantar, ficou tudo em silêncio. Afinal, ele estava morto, estirado no chão, a chave de fenda crispada na mão direita. Pai e filho entraram na oficina, quer dizer, nem entraram, pararam na porta alguns instantes depois do crime. Quando se viraram para sair, um carro de Polícia estacionou bem na frente do galpão, obstruindo a passagem.

A realidade televisiva


Tira de humor (?!) de Laerte, na Folha de hoje, que serve para ilustrar
a nota de ontem. São os efeitos reais da propaganda na Educação

domingo, 15 de março de 2009

A Bahia do PT

O governador da Bahia, Jacques Wagner, do PT, está enfrentando os piores momentos de sua administração logo agora em que já começam a se definir os nomes do cenário eleitoral no Estado para o ano que vem. Não bastasse a dengue, inacreditavelmente viva e se alastrando, a Bahia se vê infestada pela meningite, já há 11 mortes registradas nos últimos dias. É claro que o governador e sua equipe de trabalho estão fazendo tudo que podem (pelo menos se espera...), mas o venerável líder petista baiano podia incluir entre suas tarefas diárias TIRAR IMEDIATAMENTE DO AR A PROPAGANDA OFICIAL do Governo.
Os telejornais mostram o caos na áera da Saúde enquanto os filmetes de propaganda falam do grande avanço na área de Educação, onde agora, ora viva, os diretores da rede estadual de ensino são eleitos democraticamente. O que todo mundo sabe, entretanto, é que faltam professores nas salas de aulas e muitas escolas não funcionam. A intenção do Governo, claro, não é insultar o eleitor, como o senhor deve ter pensado, é apenas iludi-lo. Além do mais, esta postura política de resolver problemas estruturais com publicidade enganosa era velha prática do grupo carlista, inimigo, supõe-se, dos ditos libertadores do povo baiano.
Sabem, de fato, o que mudou na Bahia com a eleição da oposição? Fora a ocupação estratégica dos cargos públicos, nada. Estão aí as moscas que não nos deixam mentir.

Conversa velha

Hoje é domingo, qualquer pessoa que viva na Bahia morre de preguiça. Eu, então, como já morri há muito tempo, aproveito a escandalosa luz do sol para abrir aos oito leitores deste blog dois textinhos arquivados como Breve Relatos, um antigo projeto que nunca se desvencilhou de uma pastinha no Meus Documentos.
Vejam aí.

Meus olhos
estão ardendo de tanto que chorei. Estão chorando desde que acordaram. Não conseguem parar. Já é quase meio dia. Daqui a pouco os operários vão parar de trabalhar para comer a comida fria das marmitas, as crianças vão passar de volta do colégio, os carros vão cruzar como perdigotos de um monstro de ferro, e meus olhos já terão chorado mais, muito mais do que deveriam. Tenho que sossegar meu espírito, não deixar que esse alvoroço de emoções tome conta de mim, que me prostre na janela, olhando o mundo com olhos embaçados. Gostaria de sorrir, de esquecer que existo, de entender como alguém pode ser apenas feliz, mas só vejo reflexos no vidro, um pedaço de olho, meio nariz. Queria ficar apenas fumando, me envenenando, olhando as nuvens de alegria e tristezas e de outros sentimentos que se exibem sobre as casas, sobre as árvores, sob o céu, a vida dançando ao vento, mas penso que nuvens são o tema predileto dos idiotas. Minha inutilidade não merece estampa numa simples flâmula, numa bandeirinha levada na corrida por criança descalça em terreno baldio. Sinto vergonha de jamais ter enfrentado os poderosos, de não ter morrido em combate, de não ter percebido a realidade apunhalar minha imaginação dia após dia. Sinto vergonha de minha falta de sensibilidade.


Não passa
um dia em que não aprendo alguma coisa da língua portuguesa. Agora aprendi que a palavra manja é um sinônimo de tempo. Manja. Eu mais ou menos entendo por onde manja anda até significar tempo. Mais ou menos. Eu gosto muito das palavras. Não que eu as domine, não domino nem os pronomes, estes se colocam aonde querem, mesmo assim eu gosto muito de palavras. Não sei ajeitá-las em frases exatas, bem pontuadas, na verdade quase nem sei escrever, mal disponho de um vocabulário abreviado e outro de idéias ainda menor, quase sempre começo as frases com não. O texto sai como os de diários pessoais, aqueles que abrem com aspas, aqueles que desconhecem que aspas são as mascarazinhas da história. As poucas pessoas que sabem escrever, como alguns senhores portugueses e colombianos que sabem contar histórias, são balizas de conhecimento, promontórios de onde se observa a vida. Só podemos vê-los em letras minúsculas, são muito discretos, tímidos, mas quanto mais nos inteiramos do texto, mais folheamos seus livros de tantas e tantas páginas, mais descobrimos seus humores, intolerâncias, truques, sua arte distinta de equilibrar pensamentos. Um escritor como os senhores portugueses têm tantas palavras na cabeça que podemos percebê-las esvoaçando como moscas, como estrelas no céu, tantas, tantas e ele as controla todas, tranqüilo, como se navegasse mares do passado, uma sinfonia de doce beleza, parece chuva de luzes, sei lá, acho que doce beleza está bem. De verdade mesmo, só sei que é nesses textos, deles, que se aprende a língua, e não nestes, meus.

sábado, 14 de março de 2009

Você já veio a Bahia?

Acordei com pena dos brasileiros, daqueles que não moram em Salvador. São Salvador. O sol nunca esteve tão quente e parece que nunca mais vai se por. A moça do tempo avisou ontem à noite que hoje estaria nublado ou chovendo em todo território nacional, exceção da Bahia, claro, pois como se sabe este Estado tem relações mais íntimas com os efeitos da religiosidade e com o ir e vir frenético das coisas que não existem. Isso quem diz sou eu, não a moça do tempo. E digo mais. Quem puder que venha passar o fim-de-semana na Terra da Felicidade. Tem sol para todos. E as mesmíssimas maravilhas que se paga em suaves prestações pelo mundo afora.

Café da manhã

O ministro da Economia do Brasil, o senhor Guido Mantega, na ânsia de desdizer a si mesmo, acaba de decretar o fim da credibilidade de todas as declarações oficias do Governo Federal na área econômica. Há dois dias, o ministro apareceu na mídia com cara de alta preocupação, quase pânico, com a contaminação do Brasil pela crise internacional. Ontem, o ministro reapareceu sorridente, dizendo que o pior já passou, está tudo bem, o país retoma o caminho do crescimento, embora o próprio presidente da República houvesse dito, horas antes, que a marolinha era gravíssima e que o Brasil teria crescimento zero este ano. Para embutir um mínimo de veracidade ao conto da carochinha, o ministro revelou que o pior mesmo havia acontecido nos três últimos meses do ano passado. Nos três últimos meses do ano passado, este mesmo ministro exultava com os resultados extraordinários da economia nacional. Quem tem um mínimo de informação e observa a cena política nacional com atenção deve estar imaginando que este cidadão nada mais é do que um cínico deslavado. Ou um tipo de mantega que não serve nem para passar no pão.

sexta-feira, 13 de março de 2009

Lógica formal

O escritor Millôr Fernandes foi claro e exato ao abordar o caso do arcebispo de Olinda e Recife. Aliás, talvez seja a consideração mais lógica de toda a repercussão da mídia. Então, com vocês, a opinião de Millôr sobre o malfadado arcebispo:

- Esse cara não entende nada de transas, legais ou ilegais, e muito menos de aborto, legal ou ilegal. Por lei eclesiástica ele não pode comer ninguém.

Um horror de Presidente

Os roteiristas de filmes de terror devem estar impressionados, como eu estou, com o desempenho catatônico deja-vú do senador José Sarney em sua volta ao topo das decisões na política nacional. Ele não anda, flutua. E não fala, sussurra.
O ex-presidente da República parece ter incorporado de bom grado a pose de múmia bondosa insinuada por parte da mídia e alguns blogueiros desfiliados de portais comprometidos, como eu, por exemplo. Mas, meninos, confesso que errei. Olhando com atenção o desempenho público do veterano político de carreira, dá para reparar que não se trata da múmia da Madre Tereza de Calcutá, como todos imaginávamos, mas sim da velha e má múmia assassina. Será que alguém do Partido dos Trabalhadores tem uma bala de prata sobrando ou gastaram todas com o vampiro da Avenida Paulista?

Jogando caxangá

A Igreja, afinal, levantou a batina e deu um passinho atrás. O arcebispo de Olinda e Recife está desautorizado. O fanatismo extremado do servo de Cristo serviu apenas para salientar o abismo entre os preceitos religiosos católicos e a realidade da vida. Hoje, na real da real, ele não excomunga nem o ratão do banhado que o trouxe à vida.
A CNBB poderia aproveitar esta tímida marolinha revisionista e nos explicar o que fazer com a diferença da conta no tempo de existência do homem sobre a face da Terra, pois ontem mesmo os cientistas (Santa Ciência!) anunciaram que o eretus chegou a Ásia (chegou!) 750 mil anos atrás e a Igreja, como todo mundo sabe, só admite a vida humana há quatro mil anos. O que o homem, e a mulher por suposto, ficaram fazendo neste vácuo de 746 mil anos?

A herança

O surpreendente retorno do ex-presidente Fernando Collor de Melo ao cenário político nacional começa a criar embaraços ao Governo Federal. O primeiro ato de Collor na presidência da Comissão de Infra-estrutura foi no sentido de restringir a influência política nas indicações para cargos que necessitam de aprovação do Congresso Nacional. O pretexto do senador é a moralidade pública. O alvo é o Presidente da República. O objetivo é a Presidência da República.
Como já disse no caso da relação desatinada com o PMDB, ou o Governo Federal engole Collor agora, ou Collor vai cheirar o País inteiro. O homem está cheio de pique, basta reparar em sua velha expressão de obstinado. E desta vez parece turbinado também por um outro combustível ainda mais poderoso: o ódio.

Novos tempos

Sexta-feira 13, lua minguante, sol cheio, céu azul, as nuvens são poucas, esparsas e difusas como a esperança, mas a claridade da manhã é tão forte que até os diretores de sindicatos devem estar com vontade de trabalhar. Há uma única leitura nas entrelinhas das manchetes dos grandes jornais e portais, A marolinha está devastando o País. A bolha artificial de consumo estourou, o mundo mágico dos eletrodomésticos em suaves prestações revela-se exatamente igual aquela antiga realidade de desejos aprisionados nas vitrines. A única saída do povo iludido é não pagar a conta.
Como se sabe, as nuvens não morrem jamais.

quinta-feira, 12 de março de 2009

Eu e a Máfia

Vocês não têm nada com isso, mas fui ao médico agora à tarde para exibir minha excepcional performance nos exames laboratoriais e, na verdade do mafioso vestido de branco, só consegui resgatar a prometida notinha vespertina.
O doutor não apenas desdenhou dos meus índices abaixo da zona de perigo como recomendou que eu perdesse dez quilos e parasse de fumar imediatamente. Resolvi contar a história do músico cubano Compay Segundo. Como todo mundo sabe, o genial compositor morreu aos 97 anos e fumava charuto desde os cinco anos de idade. Foram 92 anos de fumaça nos pulmões. Confessei ao ingênuo médico cirurgião que estava determinado a bater o recorde de Compay, embora não vivesse sob o ar limpo e livre de Cuba. Ele sorriu amarelo e me conduziu à saída da clínica, gentilmente, como se expulsasse do sanatório um louco inconveniente.
Os médicos são estranhos. Não têm senso de humor e nem entendem nada da vida humana.
E voltei pra casa assoviando Joaquín Sabina,
yo no quiero comer una manzana por semana sín ganas de comer,
el que yo quiero, muchacha de ojos tristes, es que muerra por mi.

Os favoritos


Dilma Roussef e José Serra trocam olhares indecifráveis

A mídia golpista e reacionária está escrevendo diariamente a crônica de uma eleição anunciada.
A mídia já resolveu que só há dois candidatos à Presidência da República. E o pior é que tem razão. Neste instante da vida política nacional, só Dilma e Serra são nomes possíveis de assimilar a definição de presidente da República. A foto da capa da Folha de hoje é, na verdade da realidade inversa da comunicação, a legenda do dia. Notem o carinho semiclandestino no olhar recíproco dos noivinhos da Nação. Comovente.

A testemunha

O sol parece ter amanhecido nesta quinta-feira disposto a acabar com as chances das águas de março. Como não gosto de sol nem de praia e estou recuperando lentamente a vontade de alimentar este blog semiclandestino, vou ficar na companhia alienada de um cachorro, o bravo Gabeira, de um gato, o traiçoeiro Gato Preto, e de 1.200 sabiás e bem-te-vis e sanhaços e pica-paus e jandaias na luz desta manhã sufocante. Talvez, à tarde, desove algumas notinhas instigantes. Afinal, dependo apenas de disposição para trabalhar, assunto não falta, taí o Lula que não deixa ninguém mentir sozinho.

quarta-feira, 11 de março de 2009

Lá vem ela...


Enquanto Lula brinca com fotógrafos, Dilma rói as unhas
Quando a crise econômica mundial botou a crista de fora no horizonte, o presidente Lula agiu rápido. Brincalhão, disse que era apenas uma marolinha. Entusiasmado pela falta de questionamento da mídia golpista e reacionária, animou-se a acrescentar que a economia brasileira era sólida, uma das demais estáveis do mundo, e que nosso país estaria a salvo de qualquer problema. Agora descobre-se que a queda do Produto Interno Bruto é uma das maiores do mundo. O fabuloso crescimento continuado que o Brasil vinha obtendo foi castrado pela crise mundial. O Brasil deverá ser, segundo os analistas internacionais, um dos países mais severamente atingidos.
O presidente Lula sabe que crise econômica é capaz de derrubar governantes, mas também sabe que pode jogar a culpa de todos os males do País na falência do sistema financeiro internacional, quer dizer, ele tem um vilão a quem atribuir a marolinha que se transformou numa enchente incontrolável.
Então, voltou a fazer piadinha.
O zero projetado como melhor sinal de crescimento da economia nacional já é visto pelo presidente como um dos mais bravos e combativos zeros da história desse país.
Dilma Roussef, sem ter nada a ver com isso, apareceu duas vezes na matéria do Jornal Nacional sobre a “repentina” crise que chegou ao Brasil. Cara de assustada, disse nada que alguém pudesse lembrar no minuto seguinte.
José Serra não foi visto nem na materinha de alagamento em São Paulo.
Devia estar em casa morrendo de rir.

De saveiro...

Hoje amanheceu chovendo, a gente lê o noticiário do dia com mais atenção, e fica logo com raiva do Lula. Mas agora abriu o sol, um sol que transforma bermuda e sandália havaiana em traje esporte. Sinto saudades da praia, e o verde cristalino de Itapuã está a menos de cinco minutos de carro. Mas isso aqui é Bahia. E na Bahia até os gaúchos sabem que cinco minutos de carro demora uma encarnação, uma eternidade...

terça-feira, 10 de março de 2009

A evolução da criação

A propósito da recente discussão na mídia sobre o valor de fato das leis humanas e divinas, no momento em que o mundo civilizado comemora o bi centenário de nascimento do cientista Charles Darwin, legítimo pai da matéria, lembro de uma questão filosófica levantada pelo escritor brasileiro Millôr Fernandes e que ainda não tem uma resposta satisfatória nem da Ciência nem da Igreja e nem de quem quer que seja.
A questão é a seguinte:
O homem descende do macaco, tudo bem, mas o macaco descende de quem?
Eu, que sou ignorante, sei apenas que a espécie humana é resultado de um lento devir filogenético que teve momentos imprevisíveis em seu transcurso, mas tenho um palpite para a questão: o macaco descende do ratão do banhado. Foi o ratão que trouxe nossos ancestrais da água para cima das árvores. Durante o percurso deve ter caído alguma coisa que acabou virando gente que deu em outra gente do tipo do senhor arcebispo de Olinda e Recife, por exemplo.
Simples como água benta.

segunda-feira, 9 de março de 2009

Ensaio sobre a cegueira


Tira do cartunista Angeli publicada hoje na Folha de S. Paulo. Notem a figura à direita. Qualquer
semelhança com o arcebispo de Olinda e Recife é a mais pura das intenções.

Colocadinha

A Imprensa brasileira, italiana, espanhola e argentina abriram manchetes para Ronaldo logo após o gol de cabeça no finzinho do jogo de ontem contra o Palmeiras. Desde O Estado de S. Paulo, Il Corriere dela Sera, Marca, Clarín, todos grandes jornais dos países que jogam o melhor futebol do mundo, foram unânimes em exaltar a atuação de um dos maiores gênios da bola de todos os tempos, capaz de aos 47 minutos de um segundo tempo, com mais de 100 quilos e 32 anos nas costas, com cicatrizes de três cirurgias gravíssimas nos joelhos, pular mais de um metro de altura e colocar (colocar!) de cabeça a bola no único canto em que ela poderia ir beijar as redes. Naquele instante, tenho certeza, o povo brasileiro umedeceu os olhos e travou o choro na garganta.
O cara está de volta. O cara. A gente sabe que gente assim é artigo definido, não tem ninguém igual.
O Estadão brasileiro e a Gazeta italiana tentaram verbos exaltação, digamos assim, para informar aos seus leitores o que o mundo acabara de presenciar; Ronaldo renasce, Ronaldo ressuscita. Se o velho e bom Jornal da Bahia ainda existisse, os não menos velhos e bons jornalistas que editavam aquela folha diária teriam colocado (colocado!) simplesmernte:
Confirmado:
Os deuses não morrem.

sábado, 7 de março de 2009

Todavia

Tira do humorista (?!) Laerte, na edição de hoje da Ilustrada da Folha de S. Paulo, gentilmente pirateada por este blog em homenagem às tenebrosas e eternas relações entre o capital e a Igreja.

Até a pé nós iremos...

O glorioso Grêmio de Futebol Portoalegrense vai jogar em Chico, uma cidadezinha da selva colombiana controlada pelas Farc. A obrigação do Imortal Tricolor é vencer de goleada e ainda libertar alguns reféns. Celso Amorim poderia ser o quarto árbitro. E Lula –enfim uma rima- poderia atuar como gandula.

Y los campesinos?

Manchete do portal UOL agora de manhã: bancada ruralista lidera pauta do meio ambiente.
Os produtores rurais –leia-se latifundiários- são maioria na comissão da Câmara Federal para discutir a defesa do meio ambiente. É mais ou menos o mesmo que chamar a raposa para resolver a questão da distribuição dos ninhos no galinheiro.
As conseqüências do acordo político entre governo e PMDB já estão com as manguinhas, os dentes e o revólver de fora.

Gaiola aberta

São oito horas da manhã, acabo de ler na diagonal os três maiores jornais diários, os dois maiores portais e três blogs honestos e não encontrei nenhuma notícia sobre a prisão do arcebispo de Olinda e Recife. O homem continua solto e insultando a inteligência do povo brasileiro, a sociedade civil organizada e o Governo Federal.
Este, de fato, não é um país sério. É um país onde a esquerda se finge de centro para se manter no poder com a direita, o capital internacional e o reacionarismo absoluto das seitas religiosas. Acho que é muito caro.

sexta-feira, 6 de março de 2009

Bom apetite

Ninguém neste País tem condições de dizer ao presidente Lula como ele deve se comportar diante de qualquer questão. O homem é o gogó mais convincente do pedaço, sem dúvida nenhuma, não há cientista político, marqueteiro, palpiteiro, especialista em comunicação, técnico de futebol, cantora de trio elétrico, taxeiro ou barbeiro que possa ensinar algo da arte de confundir a esta máquina natural de processar fatos e transformá-los em marolinhas. Mas às vezes dá vontade de dizer por que não te calas, meu velho.
Ontem mesmo, depois da estrondosa vitória de Collor de Melo no Senado Federal, o presidente poderia ter dito tudo, menos que vai fazer uma bela salada. A salada já existe, está servida à mesa da Nação e atende pelo nome de PMDB. A questão é bem simples: ou o governo come o PMDB ou o PMDB come o governo.
Esta salada Lula não poderá temperar com pimenta, bem a seu gosto. Ela já chegou temperada com veneno.

A hora da verdade

O colo do ministro da Justiça se transformou n maior depositário das grandes contradições que o governo tem de administrar entre os valores legais do Estado de direito, as conquistas sociais de esquerda e o reacionarismo absoluto das instituições basilares da sociedade.
Tarso Genro, o excomungado, está assimilando tudo no “osso do peito”, como se diz lá na nossa terra. A qualquer momento, explode ou sofre um infarto.
Espero que exploda e mande deter, algemar e trancafiar em uma cela do velho presídio da ilha de Itamaracá o fanático religioso que se atreve a evocar o obscurantismo para solucionar as conseqüências de um crime contra uma criança de nove anos. Depois de dez anos refletindo sobre a realidade da vida, por exemplo, o senhor arcebispo de Olinda e Recife seria então deportado para o Vaticano, de onde, claro, nunca deveria ter saído, nem ele nem essas idéias de lesa humanidade.

Ai de mim

A guerrilheira manequim foi à missa pedir a deus que lhe dê um bom discurso na hora do parto eleitoral. Esse é o resultado prático da democracia como regime político. Os guerrilheiros agora rezam. Os torturadores agora são delegados de Polícia. Os ladrões, bem, os ladrões continuam roubando...

quinta-feira, 5 de março de 2009

Vixê Nossa Senhora!

O arcebispo e Olinda e Recife ordenou a excomunhão de quem fez aborto em uma menina estuprada. O sacerdote do Senhor Criador do Céu e da Terra disse, ontem , 4 de março de 2009, o mesmo dia em que a Nasa definiu um satélite telescópio sideral para buscar planetas semelhantes ao nosso na imensidão do universo, que as leis de Deus estão acima das leis do homem. Além, muito além do debate entre criacionismo e evolucionismo, o santificado arcebispo confronta, isto sim, as leis do bom senso e da civilidade.
O Ministério Público devia representar legalmente contra esse primata santificado.
Ou a Igreja católica se recicla diante das verdades da Ciência e da realidade das relações humanas ou, afinal, graças a deus!, o fanatismo não resistirá ao novos tempos.
Estes farsantes inquisidores celestiais serão reduzidos à categoria de circo.

Dos males, o maior

A melhor conseqüência que se pode prever -ou ansiar- desta excepcional volta de Fernando Collor ao cenário político nacional seria esta reentré provocar a aproximação política de governo e oposição. PT e PSDB, para felicidade geral da Nação, falam a mesma língua quando o caso é Collor. Espera-se que em breve comecem também a falar a mesma língua quanto ao PMDB, por exemplo.
Se for o caso de um candidato único sugiro José Roussef. Ou Dilma Serra.

Falta de categoria

O pior de toda essa reviravolta na marolinha diária do Congresso Nacional, pelo menos para os olhos de observadores independentes e de especialistas em comunicação, é ver figuras oportunistas e despreparadas tecnicamente, como os senadores Almeida Lima e Wellington Salgado, dois adesistas que chagaram ao Senado pela porta da suplência, pontificarem no debate político ideológico com filosofias rasteiras e sua evidente falta de cultura e até mesmo de propósitos políticos que não sejam única e exclusivamente cavar emendas em benefício de seu grupo no orçamento federal. É mais ou menos como assistir dois flanelinhas discutindo a engenharia de trânsito em São Paulo.

Trancos e barrancos

A volta de Collor ao teatro político nacional, com os mesmos olhos arregalados, postura arrogante e discurso ferino e agressivo, e as ressurreições de Sarney e Renan Calheiros, sempre com o cinismo e a desfaçatez na ponta da língua, desvendam uma realidade política frontalmente oposta ao cenário de conciliação partidária que os estrategistas políticos governistas acreditavam ter montado para o futuro espetáculo eleitoral.
O ex-presidente entrou em cena chamando sua adversária, a senadora Ideli Salvatti, de galinha. O senador Aloysio Mercadante saiu em defesa da companheira e disse que a eleição de Collor para a presidência da Comissão de Infra-estrutura se devia a uma aliança espúria. Talvez fosse melhor ficar calado. Soco na cara não se devolve com tapa de pelica.

A hora do baile

Pois, vejam só o que é a natureza política. O principal instrumento do Governo Federal para eleger seu candidato, ou melhor, candidata a Presidência da República, está nas mãos do ex-presidente Fernando Collor de Melo. A fragorosa derrota imposta ontem no Senado Federal ao PT por seu maior aliado político, o PMDB, embaralha as cartas do jogo da sucessão, as mesmas cartas que já estavam bem marcadinhas e pareciam definitivas.
Pouco depois do surpreendente resultado, o velho candidato terceira-via, Ciro Gomes, reapareceu falando na necessidade do presidente Lula ampliar as alianças e definir um candidato alternativo, ele mesmo, Ciro, o doido, claro. A partir de agora, pode acontecer de tudo. Tudo mesmo. Até o terceiro mandato.

quarta-feira, 4 de março de 2009

Dois dedos de prosa

Nesta manhã que a Bahia parece fazer topless na praia, num calor contido como a temperatura ideal do vinho, reparo que pássaros e micos se reacomodam nas árvores aqui de casa, um casal de jandaia ocupa o buraco no coqueiro de um antigo casal de pica-pau, e um bando de nossos ancestrais voltou a devorar ninhos a frutas como se tudo no mundo fosse deles, e é, nesta manhã em que hay pan para hoy, que só me faltam os malditos cigarros e não sei aonde se enfiaram duas ilusões que pensava tê-las tão bem guardadas, me ocorreu um raciocínio que talvez ajude a decifrar a nota que está abaixo desta, nesta onda do é agora ou agora.
Como se sabe, a democracia se revelou o instrumento mais eficaz do sistema para acabar com os movimentos revolucionários. A suposta vontade da maioria expressa pela igualdade do voto, impulsionada e patrocinada pelo poder econômico, legitima governos tão gaiatos quanto espúrios, todos em nome do povo. As bandeiras de consciência acabam em passe de mágica, os homens que iam mudar o mundo acomodam-se em seus gabinetes e, pronto, vida que segue. Ninguém governa para elaborar e aplicar políticas públicas efetivas e conseqüentes, todos governam pela ocupação de espaço, e em alguns casos como se não existisse ninguém além do governante, são terras de um homem só.
Então, diante deste ocaso incontestável da esquerda revolucionária, seria razoável pensar em uma ditadura da intelectualidade como o modelo político mais recomendável?
A resposta equivale a decisão de onde enfiar o voto.

terça-feira, 3 de março de 2009

Depois do carnaval

Agora que nada é sagrado, agora que todo dia chove no molhado, agora que quase todos esquecemos a revolução, agora que todos os males são do coração, agora que não iremos mais a lugar nenhum, agora que Lula pintou o cabelo de blonde prateado, agora que os empregos moribundos começam a morrer, agora que um grão de trigo vale mais que o pão, agora que temos de saudar heróis de canetas douradas, agora que a democracia está forte e consolidada, agora que de nada mais adianta identificar e prender os assassinos do Doi-Codi, agora que o MST vai ser proscrito e perseguido, agora que negociam cargos públicos como insulina no mercado negro, agora que a fidelidade profissional vale mais que talento e conhecimento, agora que o Bahia não pode mais ser campeão, me diga, meu bem, aonde, afinal, eu vou enfiar o meu voto...

segunda-feira, 2 de março de 2009

Ano novo, vida velha

Ando meio desligado, meio preguiçoso, meio deja vu. Não sei bem o que é, a depressão tem várias faces, a minha costumava brincar como palhaço de salão, agora parece uma senhora séria, cabisbaixa num canto da varanda a me perguntar em silêncio quando a vida recomeça.
Segundo o calendário real, recomeça hoje, segunda feira, dois de março. Mas da minha incurável ótica transversa, o que acontece hoje é o fim do ontem, então, portanto, hoje é o fim do ano que passou e depois sim, amanhã talvez, o início do ano novo. De um jeito ou de outro, na real da real, tenho nada a dizer.
Ando preferindo ler a escrever. Pior para vocês, leitores habituados a fuçar blogs internet afora em busca de idéias e opiniões que os ajudem a decifrar a realidade política, econômica e social de "um país como este". Sugiro que leiam o Josias para entender melhor a letra do samba enredo do carnaval que não acaba nunca ou vão colher batatinhas ou abobrinhas ou maças envenenadas na lavoura do Noblat.
Eu vou ler os últimos capítulos da Viagem do Elefante. Vocês deviam fazer o mesmo. Ajuda a entender onde termina a literatura e começa o cinema. Ou o que fazer com dez reais dentro de uma padaria suburbana.