domingo, 29 de março de 2009

Aniversário de morte

Comentário de uma jornalista especializada em defesa de direitos da infância e juventude.

Meninas sacrificadas

Isabela, Maddie MacCann e Raquel, meninas sacrificadas em templos que a moderna barbárie instalou no centro de grandes cidades. Há cinco meses, dias depois de ganhar um concurso de redação, Raquel é um corpo dentro de uma mala que a polícia ainda não sabe como e porque foi parar ali. Maddie, a inglesinha com cara de anjo desapareceu, desvaneceu-se, virou uma lenda apesar das milhões de libras e milhões de fotos espalhadas por todo o planeta. Há dois anos, um mega mistério. Já a vida e a morte de Isabela Nardoni passou na televisão. Todos vimos Isabela bebê, Isabela na escola e, na cena final, uma boneca no papel de Isabela, pendurada por um dos braços, um segundo antes de cair do sexto andar no vazio escuro da noite paulista.
Se não temos o corpo de Maddie e Raquel é só um corpo, a história de Isabela tem começo, meio e fim, horários cronometrados, cenários, diálogos e vários personagens. Isabela, aos cinco anos, nos conta uma história para adultos, de horror e loucura, que completa hoje um ano.
Os bárbaros do século 21 vestem roupas de grife ou estão nus embaixo de farrapos, comem cheeseburger, vão ao supermercado, falam ao celular, viajam de ônibus, avião e automóveis. As crianças sacrificadas, no entanto, são iguais às de sempre. Sabem usar computador e outras tantas máquinas, falam línguas, opinam, mas são os mesmos sorrisos crédulos, frágeis, a mesma interrogação e o mesmo brilho nos olhos, o brilho da vida.
Como pode alguém violá-las, arrancá-las do berço, surpreendê-las a caminho da escola, negar-lhes o último colo, o último sorvete, calar-lhes o inevitável ultimo grito pela mãe que não vai chegar?
É o que pensamos nós, os não bárbaros, nós, os civilizados, que não sacrificamos meninas, mas estamos na platéia, diante dos altares, no turbilhão do ritual, que já não nos emociona mais.


Eleonora Ramos

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